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quarta-feira, 17 de abril de 2013

Pianistas do futuro. Onomatopéia contemporânea.

Porque chamar um filme que aborda singularidades da espécie homem de ficção científica? Tudo bem que ficção é praticamente tudo. Ou não seria?
Teríamos realidades mais realistas do que outras? A afirmação de que um fato por ser considerado enquanto produção da ciência ( mas qual?) tem maior importância, maior riqueza nas suas cosntituições do que outro invalida o que não é considerado por essa via? Seríamos adeptos fervorosos do positivismo de Augusto Comte e o 'slogan' de nossa bandeira verde e amarela que estabelece progressos mediante algumas ordenações? Ordenações supostamente cientificizantes?
Ciência para eles carecia de comprovação empírica e o nobre conhecimento- fazer ciência e suas observações decorrentes-  restringe-se  à matemática, à física, à biologia, à química.Virou igreja. Chama-se 'Igreja para humanidade'.
E o que não seria da ordem da ciência, da ordem do conhecimento - tal como indica O pensador e Psicanalista brasileiro MD.Magno- acresentando que o poder que alguns desses saberes, ditos científicos, exercem é da ordem do que chamamos milagre. Por milagre entende-se as possíveis alterações, transformações, em nível biótico, primário, na nossa espécie e até de outras formações do chamado haver, por vias secundárias, simbólicas, artificiosas. Nossa posição de gozo enquanto espécie. Algo que já contraria um ortodoxo positivista ( estaria embalsamado tal criatura?), aquele que crê possuir a opinião certa, correta, visto que essas configurações que denominamos de naturais, não humanas, não se transformam. São imutáveis aos seus olhos. E para as senhoritas, o destino lhes reservaria positivamente uma bela maternagem, um fogão e uma roupinha ordenada para passar. Isso pode parecer uma tolice, mas é importante já que envolve, no que tange as pesquisas e estudos sobre comportamentos e suas vicissitudes, considerações a respeito da saúde mental de alguém, por exemplo.
O cidadão/ã faz as suas considerações a respeito de quase tudo e acha que se faz entender já que alguém lhe responde. Mesmo que a resposta seja silenciosa. Esse fazer entender é porque acredita- e teve toda a formação escolar, familiar, repleta de sujeitos, objetos, cartesianismos, geometria euclidiana, catequeses, linearidades, etc- ,  que ao dizer algo, esse algo não lhe parece  nem um pouco delirante. Já que alguma coisa pelo lado de cá soltou umas frases que para esse emissor possuem algum sentido, alguma lógica. E possui.  Além do mais,  o receptor a recebe- essa frase, esse dito, esse gesto- e fará algo com isso nem ques seja coisa alguma.
Portanto, considerar um delírio só porque aquilo não me faz sentido pode ser grave. Qualquer pensante ou inventor de maluquices ainda não pensadas - os heróis da nossa história, e não confundam isso com adorações positivistas-  sabem disso. Distanciar-se da rotina, dos hábitos cujos sintomas triunfaram, das convenções estipuladas, pode implicar em risco de morte. Morte que não há. Logo, o preço pode ser altíssimo. É só lembrarmos de um Copérnico carbonizado, de um Galileu Galilei silenciado por lei sagrada e fascista ou de um Freud quase deposto para campos de concentração ( se não fosse o prestígio aristocrático de uma  ' Maria' Bonaparte).
Se não houver esse trato para com quem ou o quê se está conversando, considerando, ,ou seja, um analisando, um amigo, a esposa, a famigerada família , a areia da praia, o sol que queima, o Estado  - que nos diz que não podemos não saber sobre as leis que ele exara -, a situação permanecerá na sua precariedade, paralisia ou destruição dos vínculos estabelecidos. E não se vive sem eles! Como viver desvinculado da temperatura ambiente, da gravidade, do cuidado amoroso materno inicial? Felizmente, existe a mente humana ( e apresentada por Magno enquanto análoga ao Haver, à nossa Cosmologia) capaz de avessar nossas estupidezes primárias, bióticas, através do artificialismo dos múltiplos' gadgets'. As leis convencionadas em parlamentos e julgadas, apreciadas, nos tribunais, existem para coisas muito boas e outras tão tenebrosas....Mas necessárias. Uma anarquia é resistência à civilidade.
Estaremos condenados a uma solidão sem pares se isso tudo não for incorporado.  Até porque só  conseguirá mensurar uma pequena parte do que se apresenta. O que estiver em potência, em emergência, só será possível ( se o for) com as máquinas quânticas por vir. Diferente da solidão inarredável por se entender que -em última instância- estamos sós de fato e direito. Desde o início. E essa é feita de silêncio, susto. Nos sintomas humanos constitui a morada da angústia.
Freud, para sua didática, estabelecia uma dupla face desse angústia. Haveria um mecanismo de automatismo, mediante a força pulsional em direção ao muito além do que o desejo deseja,e que não há, e um traço, um sinal composto, formado, por essa formação-sensível que é da ordem de um desamparo absoluto. Ele denominava à sua época de sinal de angústia. No primeiro caso, estamos na possibilidade de escutarmos e considerarmos os dessa espécie semelhante nas suas singularidades, nas suas gramáticas pessoais. Temos companhia possível. No segunda face, e que engendra o automatismo do primeiro mencionado, a companhia já se foi desde sempre, pois nunca houve de fato. Somos pares porque únicos nessa singular viagem até o lugar sem papo possível. Só no retorno, porque não tem outra saída. Essa é a 'saída' de emergência possível. É sempre por dentro. Essa forma de vínculo é o que a Novamente, a Nova Psicanálise, chama de vínculo absoluto. Não há papo ali, mas estamos juntos na solidão.
 Millôr Fernandes, vizinho nobre, aristocrático na vida, declarou entender bem disso, isto é, dessa solidão do tamanho do haver, desde os onze anos de idade. Perdera os pais por essa época. Começou sua guerra pela sobrevivência. E ganhamos todos. Millôr foi um ótimo exemplo de uma posição anti-neurose, pois não fez dessa dor uma arma para se vitimizar. Ele não se perguntou o porquê e tampouco permaneceu tentando responsabilizar o mundo e  outrem pela sua saga. Ele prosseguiu com brilhantes. E é curioso que essa sensação única, singular de terror, de fim, para Pessoas ( meninos, meninas), está sempre reportada à idéia de perda. Quando na verdade a tal perda, essa ausência, esse desaparecimento, é uma metáfora possível de um excessivo querer eterno...Que não cessa em buscar - parece até adolescente com suas bebidas energéticas à procura do tesão indelével- uma configuração, uma formação, que não é desenhável, inscritível, comível. O que se inscreve constantemente é esse querer. Então é mais do que inteligível que um desaparecimento de uma formação, sobretudo uma Pessoa que nos seja muito cara ( e ela não nos salvou e nem indicou o caminho) provoque tanta afetação. Quase uma amputação. Aquilo se desprendeu daquele cidadão/ã por onde saem frases, gestos, ruídos, quereres. Estava colado.
Inconformados - o que pode ser ótimo, pois haverá guerra possível-, indaga-se sobre a possibilidade de se vislumbrar uma possível fronteira entre essa que sumiu e a que permanece. E quem ou o quê pode restar? Ambas. Existe memória, trauma. Existe o inconsciente. Os fatos são fixados, recalcados, e não se pode apagá-los como se não houvesse tido. Desliza-se, substitui-se, esquece-se, inventa-se. Caso contrário, como que a história dessa nossa gente teria se dado? Atravessaria milênios? Haveria futuro?
As crianças nas salas de aula devem se perguntar, espantar-se e serem espantadas. O seu mundo inclui um repertório que alguns adultos velhos acreditam ser menor, mais pobre. Por quê? São mais pobres em certos setores - até pela ignorância sobre tantos saberes pregressos ( iguais a todo mundo portanto)-, porém mais ricos em outras regiões constituindo assim fatos contemporâneos que os constituem por conseguinte. Devido à velocidade das novas tecnologias, as pessoas-crianças têm uma rede de conhecimentos, próteses possíveis, bem mais ampla do que tinham o Dr. Freud, Copérnico, Galileu, Giordano Bruno, Homero e muitos outros que também estão na lista de imortalidade dos positivistas.
Suas pequeninas mãos escrevem com barulhinhos de teclar teclados, teclar afetos. Observam materialidades virtuais em telas computacionais. Uma onomatopéia contemporânea mesclada com outros sons de todas as épocas. Ao mesmo tempo? Seria possível? Fantasia? Realidade?
 Uma nova forma de fazer ciência. Produção de conhecimento, sim. E tão delirante quanto o texto que lhe pretende ofertar significações, suposições. Seria possível uma gramática desconsiderando a semântica? Sonho lindo, logo um belo delírio, de um Chomsky pensante.Um outro pensador de brilhantes. Vive lá nas Américas ao Norte.
 São pianistas do futuro. E o futuro já era.

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