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terça-feira, 5 de junho de 2018

Personagens e quereres no palco onde bola rola.

Vai chegando a hora e a turba se agita. Vindos de todos os cantos da cidade, de outros lugares e de um outro planeta. Sim , outro planeta. O cidadão e sua barba longa e ruiva- mais parecia uma cerveja 'bock' - comandava uma curiosa coreografia entre os seus amigos não menos estrangeiros. Tentei desvendar aquele sotaque , mas o barulho ao redor impedia.
Aterrizar são e ,iludidamente, a salvo e a cerca de alguns metros da arena para o combate, hojendía, é ato de heroísmo. No último embate decisivo, mês de Dezembro que morreu junto com 2017, houve arruaça, quebradeira, gás de pimenta, gás lacrimogêneo , pancadaria e derrota. Uma ofensa ao esporte coletivo número um do país. Nada parecido com os dribles e artimanhas da mistura Pelé/Mané. A maioria envolvida no conflito, no meu modo de jogar pelada, nunca viu um bom jogo de bola por aqui. Quando essa abstinência se torna incontrolável, delírios, sudoreses, palpitações e mal estar entrando em campo, recorrem aos campeonatos europeus de primeira linha. É por lá que os meninos talentosos do Brasil, quase sempre oriundos de segmentos sociais mais humildes ou muito pobres, 'exilaram-se', Cada vez mais jovens.  Empresários, no caso do futebol, uma espécie de tumor metastático corroendo, inflacionando o mercado e levando à banca rota as instituições que formam os atletas. Seriam pedófilos? Mercenários? Não. São empresários a serviço da estranja. E o 'Brazil' adora um gringo. Sobretudo, europeus, estadunidenses..
O antigo ex-maior estádio do mundo metamorfoseou-se numa espécie de campo de golfe para aquela turma deslumbrada e seus adereços na cabeça: uns guardanapos superfaturados que levaram o Estado do Rio à ruína. Quem o frequentou desde os tempos da sua soberania, sente a amputação.
Agora, existem mil e um setores com letras e orientações geográficas detalhadas. Isso tudo disponível para uma população que ainda sofre com analfabetismo resistente, resiliente. Sem contar os valores a serem cobrados pelos ingressos. Felizmente, para sobrevivência de alguns mandatários do esporte bretão, reduziram os valores para viabilizar o acesso ao' novo estádio de golfe', visto que tratamos de uma atividade desportiva, outrora, popular. A mais popular do país continente.
Maracanã cheio. Tarde chuvosa. Fria até. Gente feliz. Incrível, mas ainda existe. Após uma semana pela qual batatas, tomates, alfaces e outros derivados alimentícios precisaram de escolta armada para chegar ao destino onde serão posteriormente devorados, os humores estão em alta. Liderança e expectativa para triunfos maiores.
Os estrangeiros se divertem feito crianças. É só terminar o inverno no hemisfério mais ao norte que as crianças de todas as idades de lá se regozijam com qualquer troço. Creio até que escutei alguns adjetivos tais como: 'exotic';'amazing'.
Primeiro tempo sob suspeição. No final da etapa mortal, restando tão somente 10 minutos para o fim da batalha, o tento alentador. O gol da redenção. O único possível naquela tarde/noite de outono/inverno.
-'Onde está o Cristo? Onde está o morro famoso. A sua residência sob a Guanabara'?- Alguns conclamavam.
Os jogadores de hoje olham para cima quando alcançam o objetivo máximo que é derrotar, matar o adversário. Nesse jogo, o herói do gol triunfante, após marcá-lo, fez um coração com as mãos e o ofereceu ao povo. Vai embora, em Julho, jogar na estranja. Bem jovem, ainda. Império do Amor!
Fim de jogo, fim de festa. Três novos amigos. Um deles- conheci dentro do metrô- e tinha corrido duas maratonas em 24 horas apenas. Uma de 21 e outra com 42 kms por desbravar. Continuava bem vivo. Falava sem cansaço. Seria humano? E estava disposto- não para mais uma extravagância dessas- mas para retornar a sua cidade, no norte, no interior do estado, e que segundo ele, tornou-se uma cidade fantasma. Chamada, Macaé. Mais um gol contra da turma do guardanapo e suas perversidades administrativas.
Os outros dois eram pai e filho. O que me fez rememorar o porquê  de ainda me dedicar a esse 'hobby'. Foi através do velho pai que me encantei pela arte do futebolista. E naqueles tempos, havia arte de primeiríssima por aqui. Seria um luto possível pelo pai morto?
Antes de partir, o aperto de mão com o parceiro que estava sentado- o único civilizado naquela multidão-, mais atrás, e que com fones de ouvido me confessa: 'Venho sem uniforme do clube ou qualquer outro adereço pois sou supersticioso. Quando me fantasiava feito palhaço, assim como você está, o time jogava muito mal'. ??????????. Essa foi a minha primeira questão para ele, ou seja, interrogações criptografadas, depois da colocação que acabara de fazer. A segunda foi essa abaixo:
- E o que escutas através dos fones de ouvido?- perguntei-lhe.
- A Marcha Triunfal. Da ópera Aida, de Verdi. Bem popular. Na Itália.
Maracanã. Palco para múltiplos quereres e seus personagens.









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