Marcadores

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Assis e um Brasil; José. Um terceiro moldado de barro.

Assis Brasil foi diplomata e pensador político brasileiro. Nascido no sul, foi ministro do conterrâneo, Getúlio Vargas. Perdeu a única filha, atingida por um raio. Quatro anos depois, morreria de tristeza. Utilizando um termo bem apropriado para época, o político nascido no século XIX, 'morreu de desgosto'.
O Brasil recebe a descarga de 50 milhões de raios por ano. Somos recordistas na arte de eletrocutar pessoas ou rebanhos e também provocar inúmeros danos materiais. Nos últimos 20 anos, morreram mais brasileiros vitimados por essa demasiada excitação no interior das nuvens do que as que morreram por causa dos deslizamentos de terra ou enxurradas.
Assis Brasil escrevia bem. Tinha um texto apurado. Pensava a política enquanto ferramenta para mediações diplomáticas na destribuição dos poderes. Sem nunca se esquecer das benesses sociais. Para ele, o Estado deve servir a sociedade e não o contrário. Infelizmente, o que se observa é a prática patrimonialista e patriarcalista viciadas.
O homem que carregava o país em nome próprio pode ao menos se despedir, sepultar, reconhecer de fato e direito a dolorosa perda da filha.
No caso das enxurradas no Estado do Rio, em Janeiro de 2011, mais de duzentas criaturas e os seus próximos não puderam fazer o mesmo. Sumiram. Levadas pela água, pelo barro, pela lama, desapareceram. Não é tão simples. Existiram e sumiram de fato e direito. De direito, contudo, ainda permanecem.
Essa prática mórbida data de períodos arbitrários onde o próprio Estado exercia papel de fuzilaria e massacre das oposições, de certas diferenças. Independente de ideologias. Se corrermos com a história no mundo, encontraremos essas praticagem em ambas as extremidades. Tanto à direita quanto à esquerda.
Um outro personagem, Armando Nogueira, jornalista esportivo, botafoguense, e que sabia escrever tão bem numa época em que o futebol podia inspirar belos textos, nasceu no Acre e se mudou para o Rio. Aqui despontou. Venceu a vida. Notabilizou-se. O que é bem mais relevante do que a vulgaridade da fama.
Numa manhã- mas poderia também ser à noite- avisaram-no que ele fora declarado morto, lá na sua longínqua terra. Decidiu averiguar. Avião tomado, rumou, Vivinho de Nogueira, para se declarar como tal. Parece que não conseguiu. Diante do funcionário estatal- burocrático reificado feito estátua- apresentou-se. Mostrou documentos com foto colorida e até em preto e branco ( homenagem ao clube esportivo de sua adoração). Carregou uma testemunha. Nada. O cidadão insistia em lhe dizer: ' O senhor está morto'. Causa mortis: acidente aéreo. Armando imitava passarinhos. Era também aviador.
Por mais que pareça espantoso, a fidelidade ao enunciado primeiro, ou seja, o documento inicial que por alguma tentativa de linchamento ( sabemos que a inveja é uma merda, mas o ressentimento pode ser merda maior) poderia decidir sobre a morte de um insistente ser vivo, era extraordinariamente delirante. Vejamos que práticas fundamentalistas são bem mais antigas e com diversas nuances, credos e ofícios.
José da Silva Matarazzo Gates de Alcântara III era um homem. Logo, pode ser mais um personagem. Diante desse fato, ao menos. nenhum outro escrivão causou maiores estragos. Esse outro nasceu num bom lugar, numa hora errada. Surgiu na região das montanhas do Estado Fluminense que só sabe celebrar o Oceano. E por isso se tornara um terceiro qualquer. Na linhagem de alguns Pedros, da cidade vizinha. Seu pai não o queria. Sua mamãe, Teresa, o adorava. Contrariado, o pai fugiu com a melhor das piores amigas da mãe de José III. Abandonou aquela senhorita e outras cinco crianças na sua cidade, uma Teresa-Pólis. Reproduzem assim mesmo: aos montes. Até mesmo um Papa confessou para milhões que pareciam coelhinhos...de Páscoa.
Crescido, Matarazzo José Gates caiu do mundo. Destemido, dispensou mediações para poder caminhar com pernas tão suas. Foi criticado. Chamaram-no de arrogante. Como ousa dispensar mediações numa terra que só se dedica a essa prática? Na política profissional recebe o nome de pistolão. Mandou às favas aquele ritual dominical e também os festejos que encerram mais uma voltinha do planeta na cinturinha de uma estrela que cospe fogo e da sua própria. Transações. Não quis filhos. Pensou que poderia amaldiçoá-los com a sua singular maldição. Além do que, adorava as mulheres e seu corpo original de fábrica. Decidiu ser ninguém. E a lama odienta varrendo, limpando....E aquela chuvarada? Pegou-lhe de frente, de lado, rabo de arraia. Um cachorro foi visto se afogando. Sua dona escapou, pois coleira estava frouxa. Houve gente que torceu mais pelo cachorro do que pela mulher. Eram mulheres, na maioria.
Parece então que esse Silva enrustido virou, sobretudo ou finalmente, ninguém. Esculpido e eternizado pelo barro. Escombros. Será que Caminhas de mãos dadas, seresta a cantarolar supostas arrogâncias, agora, de Marianas?

Nenhum comentário: