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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Mamãe está cozinhando

Um colega me lembrava sobre as confusões que a nossa prezada língua pode nos pregar.
A gente se esquece disso ,pois supomos que podemos nos comunicar pra valer.
Não sei tampouco se é vício de catequese antiga - com o perdão da redundância- ,mas a vontade enebriante de tentar convencer os outros de que aquilo sobre o qual estamos falando é também para valer,cega.
Queremos ganhar todas as discussões. Quando falo a um paciente,tenho que ter cuidado.Ele pode não ter noção alguma do que está sendo dito.E eu ,por aventura , e só por aventura de arrogância,tenho alguma?Aí,o moço silencia e eu acho que ele entendeu algo.Será?
A convenção estabelecida por nossa gente mais antiga de que aquilo que se diz é correlato biunívoco do que se vê é truque bem bolado.Mas é truque.
Temos que ter mais cuidado.
Indagava pois se aquilo que eu supunha enxergar era aquilo mesmo.
'Vocês tem que entender que isso é muito importante.Essa coisa esverdeada aqui ,bem aqui,diante do que chamo meus olhos,é verde mesmo'?
Nenhuma resposta me fora convincente,já que todos os que foram indagados olhavam-me como se estivesse lhes perguntando algo da ordem do absurdo.Repetia,repetia e nada.
Mas nada é o que mesmo?
Alguma resposta me fora dada.O fato da tal resposta não corresponder às expectativas minhas não quer dizer que estejam errados ,aqueles que de algum modo me escutaram.
Essa arrogância de reatividade é o que nos destrói.Juntamente com as vinculações amorosas de cepa cristã. E que nos fora dessas reações todas?
É extremamente difícil permanecer com certa frequência numa posição de menos afetação narcisista ,ou seja, numa postura onde os nossos gostos,nossos interesses,os nossos valores não interfiram.No pior dos casos, isso tudo que foi arrolado acima não só interfere como predomina.É o sintoma hegemônico.
E aí não consigo sequer sustentar a conversa sobre se aquilo lá que eu supunha enxergar era mesmo esverdeado.
Uma criança é uma formação inferior e que passa quase toda sua infância sendo humilhada.E é fácil entender isso,até porque os seus tesões,suas vontades,podem ser perigosas,deletérias para ela mesmo.Daí a tal repressão constante.Dependendo da frequência e da intensidade leva a todo tipo de neurose que bem sabemos.
Noutro momento,talvez mediado por mais uma confusão de línguas,o garoto me dizia entre sorrisos nostálgicos e sadismo peculiar, de quem ainda mantém um infantilismo indestrutível:' Tive uma infância muito feliz'.
Mas como?
Infância feliz?Isso existe?
Claro que sim.Se ele a disse ,ocorreu.
O fato das minhas recordações de pequeno mesclarem belezas e horrores não quer dizer que a de outrem não tenha uma média mais satisfatória!
Quando pequeno lembro,por exemplo,de viagens prazerosas e de partidas também bastante dolorosas.E as dores existiam pelo fato de que uma inadimplência de criança tem menores poderes.Tem lá os seus poderes,mas são pequenos em algumas regiões.Tal como podem ser gigantesco,os tais poderes inadimplentes, em outras.
Depois,os poderes vão crescendo e aí não vale mais culpabilizar somente outrem pela estupidez nossa de cada dia.Se bem que existe a variável fortuna ou sorte.Incidentes...
Mudei de cidade menino,sem querer.Frequentei igrejas ,do mesmo modo.Apaixonei-me pela primeira vez - fora aquela senhora mamãe - aos 14 anos.Não fui correspondido. E logo aquela filha da puta que me pediu ajuda ,num campo de futebol de salão,daquela superquadra da capital horrenda,com o meu skate exibido.Ela de patins e eu ,Romeo, de skate exibido.Não usava sutiã e pude ver os seus peitos.Lindos!!!Dias de banheiro ocupado por tempo indeterminado."Mamãe! Carlucho não sai mais do banheiro!!!!!!!!!!!!!!!!'- minha irmã única tendo ataques pelos corredores.
Minha irmã nunca gostou da minha nova paixão.Imitava o seu andar. E ela,a do andar imitado,tinha uma cadela Dálmata que se chamava Bianca.
A cadela ao menos gostava de mim.Abanava aquele rabo sempre que me via.Mas o rabo abanado que eu queria era outro.
Numa noite de Domingo (lembremos que o Domingo ,por causa do sintoma religioso pavoroso é a ocasião perfeita para se ficar deprimido), ficamos a conversar no parquinho recém inaugurado.Eu ,ela e um gorducho mais velho que se fazia de importante.Era o maconheiro oficial do pedaço.Péssimo aluno na escola,sua maior ambição era se tornar o maior maconheiro de todos os pedaços.Nunca mais soube dele.Aliás,dela e daquele repertório todo também não.
Aquela cadela certamente morreu. E aí não resta dúvida alguma sobre o que ocorreu e o que se pode presenciar e até predizer.A cadela,passados 30 anos ,morreu.
Os cachorros são assim.São mais simples e sabemos mais ou menos quando morrerão.Não criamos expectativas maiores acerca.Sabemos que muito provavelmente atravessaremos esse luto. A não ser que.....
Aquele coisa esverdeada,aquele carro verde,dentro do qual a moça que me encantei aos 14 anos voltava da escola ,todos os dias, a uma hora da tarde, era mesmo verde? Ou era só paixão e erro?
Ei!Mamãe está cozinhando!Tá bom ....Já vou! Quer ajuda?Não sei cozinhar.Não!!Você não entende! Ela caiu na panela e está realmente cozinhando!!!!Venha rápido,pois sempre será tarde e a gente não vai se entender ,por certo.

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